Segundo Barros (1988), dotada de uma insularidade que lhe é exclusiva, a cultura japonesa criou uma personalidade singular e um caráter arquetípico à sua história. Tal isolamento se finda a partir da Revolução Meiji em 1854 quando, diante de uma série de exigências externas quanto internas, há uma imposição de abertura dos portos japoneses, possibilitando o contato efetivo do Japão com o mundo e vice-versa. De acordo com Nute (2000), a influência da arte japonesa no impressionismo é um reflexo deste novo contexto, estendendo-se e intensificando no Art Nouveau, instituindo o Japonismo em toda a Europa, como uma forma de libertação do academicismo e dos padrões estéticos ocidentais.
A frescura, vitalidade e qualidade abstratas das pinturas ukiyoe cativaram os
impressionistas americanos aquando da exibição das pinturas japonesas em Paris,
Londres e Filadélfia, na segunda metade do século XIX, e iniciaram uma onda de
japonismo. (COLLCUTT, 1997, p 157)
Pinturas de Van Gogh
Ainda segundo o mesmo autor, pode-se listar, correndo o risco de excesso de simplificação, três razões principais pelas quais a arte japonesa se configurou como uma resposta entusiástica na Europa a partir de 1900. Primeiramente, pode-se apontar o crescimento da demanda por itens de luxo exótico em virtude da revolução industrial de 1870 que criou um grande mercado consumidor de alto nível econômico. Em segundo lugar, artistas, artesãos, designers e arquitetos ansiavam por formas e motivos para substituir o esgotado vocabulário do naturalismo e história da pintura. E por último, a ameaça da qualidade de vida colocada por uma sociedade cada vez mais industrializada foi dando lugar a uma nova espiritualidade, um homem que procurou contrariar a alienação tanto de natureza interior e exterior.
Como parte da nova tendência na arte no final do século, os trabalhos da Koloman Moser e Josef Hoffmann são caracterizados pela aparente contradição dos componentes dos arabescos florais e dos elementos ortogonais. Estas características também são encontradas na concepção japonesa de design, na qual motivos orgânicos e geométricos são combinados harmoniosamente.
Além disso, o artesão japonês era uma figura para quem a "baixa" arte aplicada e a "superior" belas artes gozam do mesmo estatuto - uma igualdade que a Wiener Werkstatte também defendia. Outras características da arte japonesa apropriadas pelo Art Nouveau foram a disciplina decorativa, a manipulação cuidadosa do material e a liberdade no tratamento da superfície.
Segundo Barros (1988), desenvolvimento da cultura nipônica esteve fortemente ligado ao Bun-bu-ryodô e aos preceitos religiosos do shintoísmo e zen budismo, dos quais se extraíram a tradição da profunda tendência estética e artística com vistas ao sintetismo, a aversão à teorização e à hegemonia do intelectualismo, como também a admiração das belezas naturais e o culto às tradições nacionais e ao misticismo. Todas estas características, como inúmeras outras, são perceptíveis na produção do Art Nouveau, mesmo que de forma obtusa.
Outros aspectos inerentes à arte japonesa também são de suma importância para a construção da estética nouveau. Fazendo uso de uma desobrigada análise específica por meio das obras, é possível listar uma série de influências nipônicas mais comuns na produção do Art Nouveau. Relativos à questão formal são notáveis o linearismo suave e preciso, a assimetria, a sinuosidade, a delicadeza, a fluidez e a estilização das linhas. De acordo com Lésoualc'h (1969), o traço japonês é, diferentemente do ocidental, extremamente expressivo, representando a condensação do movimento e a mudança em estado puro. A definição dos traços também se contrapõe às pinturas ocidentais, nas quais prevalecem a noção do volume.
Quanto aos aspectos compositivos são marcantes a perspectiva obtida por superfícies planas, o formalismo, o divisionismo, os recortes de imagem, o deslocamento do ponto de fuga, a liberdade da ordenação do espaço, a obliqüidade e a ausência do sombreamento. Segundo Lésoualc'h (1969), o tratamento da superfície se faz de forma a cobrir todo o papel com cores cálidas e delicadas em tintas planas, compondo a imagem com volumes cuidadosamente construídos com padrões têxteis e contornados com traços mais escuros, contrastando com os espaços vazios. Já o deslocamento do ponto de fuga para cima, permite uma visualização de cima para baixo da imagem, configurando-se como um traço marcante da pintura japonesa.
Na extrema singeleza que caracteriza as artes que traduzem as produções mais altas do espírito nipônico – na poesia, na arquitetura, na pintura e na música –, assim como na artesania em geral e nas artes e rituais físico-espirituais (como ikebana, kendô, shodô, chadô, o arranjo de flores, a esgrima, a caligrafia, a cerimônia do chá), manifesta-se um refinamento que traduz a experiência acumulada de séculos ou milênios, e onde o ritual estrito de alguma forma exclui a inconfundível individualidade expressa por seus praticantes. [...] Mas o refinamento, a sutileza, as sugestões diferenciadas que individualizam as obras culturais nipônicas, são precisamente o ponto em que se compraz o espírito desse povo eminentemente estético. (BARROS, 1988, p. 130)
Todos esses elementos estão presentes em maior ou menor medida nas produções do Art Nouveau, seja de forma clara ou obtusa. A análise de algumas obras nas mais diversas manifestações artísticas permite evidenciar como a cultura nipônica influenciou veementemente o estilo nouveau.
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